sexta-feira, 31 de julho de 2009

Google Maps Beats

Jackson não é apenas o Jackson City Hall. Eu nunca entrei no Jackson City Hall, mas visto de fora, tem cheiro de oficialidade americana e, só de passar na frente, é como se o nosso olhar fosse contaminar a pureza protestante que mantém a ordem da cidade.

Alabama. Esse lugar que eu só conhecia em música. 

Todas as bandas do Vale do Taquari vão tocar “Sweet Home Alabama” em alguma hora da noite, assim como todas as rádios do Vale do Taquari vão tocar “Stairway to heaven” na madrugada. Não importa a hora, se passou da meia noite, “Stairway to heaven” vai tocar em alguma estação das rádios que pegam por lá. 

Mas Alabama, Vale do Taquari e “Stairway to heaven”, nada disso faz parte do dia de hoje. Hoje eu estou em Jackson e amanhã, se tudo der certo, atravessaremos o Texas. Repetir assuntos é obrigação do companheiro de viagem e ser parceiro é só mais uma palavra para preferir estar só: eu sou parceiro de poucos. 

Alguns pensam que podem trabalhar usando a força dos meus braços, usando a agilidade dos meus contatos e a criatividade do meu cérebro. 

Aqui em Jackson o mundo anda no tempo de um folk dos anos noventa. Quando os velhos uivavam para o lua e os últimos suspiros das suas juventudes eram gastos em canções sem muita importância. Auto-afirmar-se é uma das muitas utilidades do folk, mas nem sempre dá certo. Hoje os coiotes envelheceram e a matilha vela a primeira geração antes do próprio fim chegar. Tudo é uma questão de tempo tanto para os que vivem em Jacskon, quanto para os que vivem em Lajeado. 

Mas aqui em Jackson, ao contrário da cidade onde tu está agora, a iminência da partida é só um jeito de não pertencer. 

















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Entro a madrugada disposto a enfrentar todos os meus dedos. Respiro profundamente e tento acreditar que o ar que entra em mim não pode me fazer mal. Tenho medo de descobrir que estou sonhando no meio de um sonho. Hoje a vitrola trabalhou sem parar. Hoje eu não trabalhei. Preparei duas refeições completas. Escolhi roupas para a viagem. Agora é noite e a casa está vazia, mas as chatices não param de aparecer.
Duas coisas que me irritam são:
- pessoas que se aproximam de mim para conseguir trabalho.
- amigos que não entendem as minhas brincadeiras.


O resto dou um jeito de suportar.


02’27 – não basta ter um blogue, é preciso se expor um pouco mais.


A casa dorme e eu não tenho mais calma agora que falta menos de uma semana para irmos embora. Não voltaremos os mesmos. Talvez não voltaremos. Talvez ele não volte nunca mais. Partir não equivale voltar. A sabedoria do sapato é ser um passo de cada vez. 

A casa dorme e toca Adam Green. O MSN pisca, mas não tem a menor importância. A ignorância dos insones é não deixar o corpo dormir. Toca Adam Green bem alto nos meus ouvidos e eu deveria ter vontade de dançar, eu não deveria estar aqui. Eu devia estar em um bar. Em um bar de uma pequena cidade. Um bar de uma pequena cidade onde chove há dez dias sem parar. Hoje nós devíamos estar sentados no balcão de um bar de uma cidade que não fala a nossa língua. Quando terminássemos o filme, prometemo-nos uma viagem. Viajaremos quando ele não for mais nosso. Partiremos por uma estrada perdida e pararemos nas cidades para dormir, colocar gasolina e pegar a estrada para continuar andando em linha reta toda a costa até a ponta da bota. 

Gosto de traçar rotas imaginárias no Google maps. 
Amanhã dormiremos em Jackson. Em Jackson deve haver um bar aberto a madrugada inteira. Em Jackson deve haver uma garçonete secando o balcão, mastigando um chiclete e depois tirando uma caneta de dentro dos peitos e olhando para mim pq o meu sotaque faz a noite ter algum interesse. Em Jackson existem poucos turistas. Faz dez dias que não para de chover e o bar está vazio. Mas não podemos nos empolgar. Amanhã atravessaremos o Texas sem parar para nada que não seja abastecer, mijar e comer. Prometemos não dar mais nenhuma carona e não daremos mais nenhuma carona. O Texas é o estado mais conservador da America e é melhor a gente não arriscar. Você gravou as fitas com Townes Van Zandt? 

quarta-feira, 29 de julho de 2009

a minha vida não tem nada a ver com a sua.

Quando eu era criança e cogitava morrer amanhã, sempre pensava no mundo que eu não consegui conhecer pq vivia naquela cidade. 
Hoje, quando cogito morrer amanhã, é o mundo que eu não conheci naquela cidade que me faz sorrir em paz. É bom ser otimista e muito mais certo das próprias indecisões. Decidir também é oposto de ficar onde se está. Sempre será melhor o arrependimento à angustia do que não foi tentado.
É infantil deslumbrar-se com o arco-íris. É lugar comum tentar te explicar a beleza do lugar de onde eu venho. Só quem viveu lá. naquela cidade, dentro daquele quarto, dormindo exatamente naquela cama e convivendo com aqueles fantasmas sempre que a noite terminava. Ninguém entende como eu as belezas daquele mundo. 

Em uma tarde de domingo eu, meu pai e minha irmã menor, construímos um enorme balão de papel de seda. Passamos a tarde inteira envoltos naquela fina armação de arame. Manipulando lâminas coloridas e projetando o vôo sobre as longas noites de junho no céu do Rio Grande do Sul. O balão não voou. Não era esse o nosso objetivo. Construir sobre o irreal. Era isso o que meu pai tentava me explicar.


E, hoje, poucas pessoas sacam a importância da moeda sobre o braço da vitrola. A sabedoria é analógica. A raiz mais forte sobreviverá para continuar contando a própria história depois da explosão.













na vitrola toca a-ha (crying in the rain). poucos sacam a importância de um travessão e de um trovão no começo de uma música.

terça-feira, 28 de julho de 2009

para S. - cuide de você












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Ícones morrem sem nenhum prejuízo imediato. Ícones morrem quando seus gestos já podem ser transimitados, isto é, quando transcenderam a imitação. Ontem fizemos planos, amanhã pode ser que a gente nem. Eu faço coisas que você não gosta de me ver fazendo, então eu flutuo na dúvida entre ser teu cachorro mandado ou ser o eu que eu penso que eu deveria ser. O amor, o cotidiano, o medo da morte? nada disso precisa ser explicado. É preciso espaço para que as coisas aconteçam. É preciso não medo para ter o que temer de fato. O contrario do não é a idéia. O oposto de dizer adeus é ficar.

sexta-feira, 24 de julho de 2009

Toca Townes van Zandt nessa tarde de sexta-feira. Finalmente coloco um ponto final no livro “Os Famosos e os Duendes da Morte” e Townes van Zandt é mais o livro do que o Dylan simplesmente pq o Townes foi para Dylan o que Dylan foi para mim e é para o livro. Hoje eu sou muito mais Townes do que Dylan. É preciso sempre descer um pouco mais. Agora eu devia subir no meu cavalo e desaparecer do mundo. É mais ou menos isso o que vou fazer. Sumir por dois meses. É fundamental ficar longe quando as coisas ameaçam acontecer. A distancia traz  uma calma necessária. Não vou ficar longe daqui. Escrever sou eu. Esse blogue sou eu. E eu ainda não tenho a certeza de Townes van Zandt para cruzar as montanhas do Colorado no lombo do seu cavalo. Não gosto de celulares. Prefiro o conforto do não estar. Mas para ser Townes é preciso muito mais do que isso. 

 

Hoje a cidade está parada. As pessoas choram na televisão e a única coisa que eu preciso fazer é a massagem que você me deu de presente. Sim. Eu recebo as suas mensagens, apesar de não respondê-las. Absorvo o que você me proporciona, mas não devolvo na mesma moeda. Nossas trocas não obedecem a nenhum padrão econômico. Dizem que é assim que as amizades operam. Você me conta sobre o sol, o sal, o calor. Você diz que quer me levar para o seu paraíso muitos quilômetros acima de onde estou. Eu leio e desligo o celular. Jamais ousaria contaminar a sua perfeição com as minhas palavras reais. Hoje você é Townes van Zandt e eu não vou te lembrar do mundo que te pertence. Que existe uma cidade feia chamada São Paulo. Que aqui os carros congestionam um passageiro por veículo. Somos a maior cidade do mundo e ainda não aprendemos a olhar para o lado. É perigoso ser carona. A corda sempre vai arrebentar no lado do mais fraco.

 

Se hoje eu não estivesse aqui seria uma sexta-feira com ela chegando em casa no fim do dia, gelando cervejas para assistir a novela e estocando doces para o fim de semana fazer sentido. Existe sabedoria nos rituais que se conservam com alegria mesmo cientes de que serão eternos. A sabedoria da alegria talvez seja saber que nada é para sempre. Nem minha mãe voltando para casa toda a sexta-feira. Nem meu pai fumando o cigarro enquanto ela prepara o almoço. Nem as piadas que ele lê em voz alta. Nem as mãos cortando cebolas. Nem os olhos chorando de saudade. Nada vai durar para sempre. Aproveite  o que a realidade te dá. Aproveite o rosto da tua filha. Muito antes do que tu possa imaginar, ele não será mais teu pq, na real, ele nunca foi. Não há como ser as coisas que nunca foram. É complicado acreditar que o que não foi, nunca será. 

O contrario disso é ele quem tenta me convencer. Sou eu que tento acreditar.












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I don't wanna talk.

quinta-feira, 23 de julho de 2009

terça-feira, 21 de julho de 2009

Ultimamente tenho sido confrontado a pensar em uma relação sobre a qual pouco se fala nas grandes cidades: a vizinhança. A relação íntima com os vizinhos. A literatura evidencia a solidão nas grandes cidades. “A solidão nas grandes cidades” é um termo que sempre vai me remeter aos anos noventa, quando o ser humano permitiu-se a tristeza no seu estado mais sem vergonha.

Quando as máscaras caíram, a rebeldia deu lugar à depressão. E a depressão foi o único estandarte disponível para a nossa geração consumidora de arte.  Pegamos aquele lenço sujo de lágrimas e também fizemos dele a nossa bandeira. Nossos escarros internos. Sim. Naquela época vocês já haviam comido de muito abstracionismo e entender já parecia fácil o bastante para que nós não precisássemos mais nos preocupar com entender. A geração seguinte sempre nutrirá um certo desdém diante das conquistas dos seus pais.

O retrato acima é onde situo a solidão nas grandes cidades.

À medida que a solidão nas grandes cidades refletia a angustia dos metropolitanos, toda uma geração rural, aberta ao mundo pelo ócio e pelos primeiros ventos da internet, foi exposta a esse jorro depressivo produzido longe deles. Imersos nos intermináveis vazios, cada periferia era um pedaço do fim do mundo. O que vinha do outro lado do verde era soprado por ventos que tinham viajado o que nenhum de nós ousava sequer sonhar.  Foi lá, no meio das plantações, que nós descobrimos os escritores mais tristes, a bandas mais depressivas e os sorrisos mais assustadores. O que estava na TV quase não nos interessava, apesar de assistirmos simplesmente para fazer parte da mesma família.

O tempo passou e eu, agarrado a uma lufada mais forte de vento, consegui ir embora.

Cheguei em São Paulo carregando nas malas toda a “solidão das grandes cidades” que eu havia acumulado durante anos morando longe do mundo. Vim preparado para distancias frias. Para olhares de desprezo e ignorância espacial. Nada com o que eu não estivesse acostumado naquela pequena cidade germânica chamada Lajeado.

Foi quando os vizinhos entraram na minha vida. Aqui, em São Paulo, foi o que os vizinhos entraram na minha vida.

 

O vizinho numero UM

Na verdade era uma vizinha. A dona Luzia. Fui morar no porão de uma casa e o morador da parte de cima havia me precavido sobre as perversidades de dona Luzia. Dizia ele que a vizinha gritava no meio da noite ao menor sinal de um ruído alheio. No final da primeira semana o morador de cima já era meu melhor amigo e estava empenhado em me mostrar o mundo paulistano. Eu tinha 17.

Pouco a pouco o morador de cima foi ficando bem animado e começou a chamar amigos para me conhecer. Aos poucos as portas entre a minha casa e a dele foram se esquecendo de ser fechadas e logo habitávamos os dois a mesma casa. Dona Luzia começou a ficar louca com nossa convivência ruidosa e passou a nos berrar impropérios. Nós, vingativos, decidimos fazer por merecer. Trocamos nossos turnos, passando a acordar cada vez mais tarde. As noites regadas a risadas na nossa casa e a gritos de dona Luzia na cara dela, viraram rotina. Eu, que dormia na parte de baixo em um quarto cuja janela dava diretamente para a janela da cozinha da mulher, decidi radicalizar.

Conheci uma garota meio desligada que veio morar comigo. Ela era atriz e estava sem grana. A gente ficou morando juntos com a grana que meu pai mandava. Eu com 17 e ela com 20 e a gente trepava o dia inteiro. É aí que entra o “radicalizar”. Passamos a trepar com a luz do sol na nossa cara e os olhos da Luzia espiando entre as frestas.

Os gritos da velha foram diminuindo e as madrugadas passaram a ser iluminadas por uma triste luz que vinha da cozinha da senhora. Dona Luzia havia ficado, subitamente, calma. As manhãs foram ficando cada vez mais silenciosas e ela, antes vestida em constantes trajes sóbrios, passou a fumar na varanda em frente á nossa, olhando para a ameixeira amadurecendo cada ano mais rápido. De vez em quando, quando nossos olhares se cruzavam, ela perguntava se as folhas secas que caíam da sua árvore não sujavam o meu quintal. Um dia acordei ao meio dia. Lembro que demorou algum tempo até ela finalmente aparecer na varanda, com cara de sono,  um robe cor de rosa e, apoiada no batente, fumando longamente enquanto acordava para nós.

Os dias foram passando.

Um dia Dona Luzia perguntou se eu gostava de pinturas.  Diante da minha afirmativa, ela entrou na cozinha pedindo que eu esperasse. Saiu trazendo um óleo sobre tela que havia pintado. Disse que resolvera aproveitar as madrugas para começar a pintar e que as luzes e as conversas que saíam das nossas janelas no meio da madrugada,  faziam um tipo de companhia com a qual ela aprendia a se acostumar. Sua única reclamação sobre as madrugadas que agora ela também atravessava acordada, era de que dormir tarde a obrigava acordar também tarde: - sempre que eu me acordo tarde eu me sinto uma menina cabulando aula?

Dona Luzia além de me mostrar o desenvolvimento do seu trabalho como artista plástica, também me presenteava com guloseimas que preparava afim de suportar as tardes vazias sem nada para fazer. Bolos, bolachas de manteiga, pães embrulhados em um papel alumínio cuja temperatura levemente quente eu nunca vou esquecer, assim como nunca vou esquecer o cheiro do pão saindo do forno à lenha no fim de uma tarde de inverno no quintal da minha avó materna. Lajeado é uma cidade germânica.

Aos poucos, sons tristes passaram a ecoar de um piano. Percebendo que as melodias saíam da janela de Luzia, decidi tomar sol no meu quintal e desfrutar dos acordes daquela estranha canção tocada pela vizinha. As notas que escorregavam para fora da janela eram cartões postais do seu estado de espírito. Eu gostava quando ela tocava alguma balada dos Beatles. Eram versões simples e delicadas. Quase contidas. Como uma menina cabulando aula, ela permitia interromper uma execução pela metade. Ou emendar notas que não diziam respeito à mesma musica.

Em uma de nossas conversas na madrugada, pois agora era assim, conversávamos de madrugada nas pausas para o cigarro tentando enxergar as estrelas nos poucos metros quadrados de céu que nossos pequenos quintais dispunham. Ela, pausando a sua pintura, eu pausando os meus textos, fumávamos juntos no quintal separados por um muro. Conversávamos sobre saudade. Sobre a solidão nas grandes cidades. Ela confessou que nunca havia andado de metrô pois tinha muito medo. Disse que era professora de piano e, vendo os meus olhos, ofereceu-se para me ensinar. Sem cobrar. Apenas pelo prazer de ensinar um instrumento.

Depois disso eu fui embora. Mudei de casa. De vez em quando passo na frente da casa da dona Luzia e penso em tocar a sua campainha para saber se ela ainda mora lá, se ela ainda está viva, se ainda teríamos um para para bater,  um cigarro para fumar e uma xícara do café que ela fazia. Que talvez ainda faça. Quem sabe sentar no seu piano para ver se ainda lembro dos acordes da única canção dos Beatles que eu consegui aprender nos meses de aulas semanais, tardes sem perspectiva e uma vida ainda esperando por mim.

Die Träne # 01 (20'07'2009)

segunda-feira, 20 de julho de 2009







Os dias têm sido frios e um pouco mais estáveis aqui em São Paulo. Talvez essa estabilidade se deva á aproximação de mais uma partida. Daqui há muito pouco tempo vou para longe de novo. Como as massas de ar quente e frio, eu também intercalo os espaços que habito. Sou a massa, não o terreno. O vento do acaso é quem manda no meu itinerário. Dependo de forças da natureza para continuar existindo. A iminência da partida torna a cidade menos feia. Na iminência da partida a próxima vez pode ser que não exista. Na proximidade do último é que as coisas adquirem beleza. 

domingo, 19 de julho de 2009












Tenho uma certa dificuldade para aceitar a mudança de hábitos. Mudar os hábitos, aos trinta, pode, perigosamente, ter o mesmo significado que aceitar envelhecer. Aceitar que a velhice chegou com tanta força há ponto de modificar os meus hábitos.

É estranho não gostar, e mais estranho ainda não precisar sair à noite. Quando eu era adolescente imaginava que sempre teria vontade de estar em alguma festa, em algum bar, em alguma rua, afundado em algum copo. Beijando alguma boca. Apaixonado pelo impossível. Não entendia as pessoas dentro dos seus carros voltando cedo para as suas casas. Não entendia como aquelas pessoas de quase trinta conseguiam reprimir as vontades que eu sentia. Não entendia que as vontades não precisam ser reprimidas para que possam mudar. Ser jovem eram não precisar entender o conforto do silêncio.

Hoje eu prefiro ficar atento ao ponto da batata no forno da cozinha. À quantidade de pimenta na sopa de gengibre. Ao timbre aveludado de uma canção antiga girando na vitrola. Até um disco do João Gilberto eu comprei. A vida doméstica é só mais um subterfúgio para aceitar-se velho. Ninguém chega aos trinta impunemente.

Crescer não é perigosos. Perigoso é envelhecer. Perigoso não é ser nostálgico. Perigoso é sentir saudade eterna.

Ontem a Cat Power bebeu chá durante todo o show. Ontem não foi perigoso envelhecer. Talvez não seja nunca mais. Pensei na Fram e na Tuane. E senti saudade de ser bonito.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

O tempo está andando rápido demais e algumas pessoas estão tendo muita dificuldade para acompanhar as transformações. É difícil compreender o essencial: nada é tão importante assim.

Eu entendo a demora de alguns. Os vencedores não sacam que primeiro, antes de tudo, é preciso entender-se um perdedor. Só assim as vitórias terão alguma importância.

Vencer todos os dias não vale à pena. É pesado demais.

quinta-feira, 16 de julho de 2009

domingo, 12 de julho de 2009












Existem fases da vida em que todas as pendências parecem entrar, pouco a pouco, na sua zona de resolução. Se Hamlet dizia que estar pronto é tudo, eu devo continuar acreditando no contrário.

É só uma questão de ponto de vista. E de saco cheio com as opiniões dos outros.

Todos mundo gosta de quase todos os filmes. Todo o mundo elogia o livro que lê. Todo o domingo a praça Roosevelt é a capa da folha de são Paulo. Todos gostam das musicas que ouvem. Às vezes sinto um profundo nojo desse senso comum idiota e estúpido. Mas logo passa.

Noticias chegam de todos os lados: escutar é apenas uma questão de escolha. Às vezes só precisamos ficar quietos. Devíamos ficar mais. Cada vez mais. É fundamental a sensação de um passo antes da inexistência. Calmos também devíamos ficar. É fundamental a sensação de um passo antes da calma. 

São Paulo agora é, cada vez mais, a minha cidade. São Paulo é a metrópole do futuro. Aqui também existe um sol, mas, como não posso sonhar com espetáculos exclusivos dele para mim, procuro alguma coisa que apenas eu consiga perceber. Só assim me sinto vivo. A paisagem natural da maior cidade da America do Sul sempre contém muito mais pessoas do que meus olhos são capazes de suportar. Assim como o céu gaúcho quase não cabe no olhar, a quantidade de pessoas dentro de um só prédio é impossível de exatidão. Assim como o mar de Arroio do Sal tem a costa mais infinita do estado, a quantidade de pessoas descendo as escadas rolantes do metrô consolação às seis horas da tarde é impossível de exatidão. Quantos metrôs cúbicos a lagoa dos Patos é capaz suportar?

O alto do terraço Itália é o encontro entre dois mundos. Entre dois pânicos. Todos os excessos latem no alto do terraço Itália. Ninguém entende o meu medo quando, eventualmente, estamos naquele lugar. Ninguém ouve os latidos ameaçadores da grande cidade ecoando pelo vento frio da noite de inverno.

É preciso ser natural em relação às pessoas para que os olhos possam descansar sobre uma paisagem natural em São Paulo. Os mendigos precisam ser poças sujas, desvios, apenas uma questão de não olhar. É preciso cuidado para não trazer as sujeiras da rua para o chão da nossa casa. Os obesos são vacas que, de vez em quando, aparecem em alguma curva da estrada atrapalhando a passagem. As pessoas bonitas são os passarinhos cortando o horizonte. Apenas o inatingível. O cara que rouba a carteira do indefeso é a cobra tomando sol esperando alguém passar. É preciso maldade para existir.

Existem fazes em que um só dia te empurra para picos máximos de euforia e, logo depois, para o vale profundo de uma depressão. É normal a preguiça na hora de subir a montanha uma outra vez. Descer é sempre o ponto final de qualquer escalada. Subir uma montanha pode ser simplesmente uma sucessão de esforços sem nenhum sentido aparente. A mochila carregada de agasalhos para a noite no alto é um peso que poderia ser evitado se decidíssemos continuar parados. Os galhos batendo no rosto podem não ser o exato oposto de enxergar até o fim a utilidade de cada planta. Os precipícios onde se quase morre. A planície no topo de tudo. A liberdade da parte mais alta. Ver o mundo acontecendo lá embaixo, longe de tudo, como um infinito tapete abstrato feito de estradas, plantações e vilarejos. É bom subir, mas nunca se deve permanecer  tempo demais lá no alto. As noites costumam ser frias demais e os latidos da cidade não te deixarão dormir.

A função de uma epifania nem sempre é acontecer.

quinta-feira, 9 de julho de 2009




só hoje eu não quero ter que existir. não espere minhas palavras. sem alarmes e sem surpresas. sem alarmes e sem surpresas.  nem radiohead. 
hoje nada vale à pena.
hoje eu queria estar morto para não precisar me olhar no espelho e ver a merda do outro lado.
hoje o espelho sou eu.
sem alarmes e sem surpresas por favor.
nem radiohead.


Julian's dream. aqui.



tem dias em que nada e tudo faz sentido. os opostos se encontram e eu fico sem saber como agir. a lua cheia nem sempre traz coisas bonitas. por mais bonita que ela seja.

terça-feira, 7 de julho de 2009

Quase tudo sobre cronômetros e almoços ou A Avenida Paulista em dias comuns.

As ruas próximas dos cafés da avenida Paulista,  nas horas próximas do almoço, são tomadas por um exército de engravatados. Moças vestindo tailleur passam apressadas arrancando os braços de quem fica para trás. Faz sol no final da Augusta, mas elas não ousam perceber. Sorrio para o infinito antes que outra bolsa de couro reflita a fivela dourada e os anéis pesando metais raspem suavemente a minha mochila. Os sapatos são bico fino sobre um salto grosso. Não ousam fazer carícias. As engravatadas da Avenida Paulista.

Dentro, o café contem em cada uma das suas mesas uma vasta gama de diferentes consistências de obesidade. As mesas contem expressos engolidos antes que se sinta o gosto para ter tempo de mais um cigarro do lado de fora. Três pacotes de adoçante duas balas de brinde e o celular que ela esqueceu sobre a mesa tocou três vezes antes que eu decidisse atender. Na mesa ao lado alguém gargalhou e esse alguém era diferente de mim.




Quando cheguei em São Paulo os engravatados da Paulista eram o exemplo mais próximo de algum tipo de sucesso que eu me obrigava a, secretamente, admirar. Depois de cinco anos aquilo virou um tipo de nojo. Os engravatados da Paulista nunca chegaram a ser escravos de um coach. São soldados, cronometrados, prontos para morrer. Por isso atravessam a Paulista sem olhar para os dois lados. Suas panças de hambúrguer, um buraco maior dentro do cinto a cada mês que passa. Os dentes velhos de aparelho nunca serão o que vocês quis. Os cabelos crescem raízes que nenhum tailleur do mundo conseguirá disfarçar. Nenhum tecido esconderá a cor da sua pele. Por mais que você tente, os engravatados da Paulista não vão te camuflar. 

Os engravatados da Paulista esquecem que debaixo do asfalto existe uma linha de metrô. Debaixo da linha de metrô, depois dos blocos de concreto, talvez exista algum tipo de solo arenoso. Estar sobre a Paulista é caminhar sobre uma gigante laje suspensa sobre a montanha. Atingir o topo e não receber um horizonte. O morro da Paulista é muito mais alto hoje do que era há setenta anos antes de agora. A Paulista não é mais uma terra fértil. Por mais que vente. Por mais que o sol seja lindo na parte mais alta da cidade, a avenida Paulista não é terra de criar raízes. Venta. As antenas flutuam sobre todos os prédios, fincadas no chão de concreto. Há centenas de metro da terra de verdade.

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Os domingos costumavam ser mais sangrentos antes de eu te conhecer. No fim de todos os domingos, não sei se você já percebeu, preciso ficar mais sozinho. Cochilo no carro voltando para casa ao anoitecer. Nessas horas confio na fragilidade dos seus braços. Na desatenção dos seus óculos. Minhas respostas ficam menos sonoras. Menos sorrisos. Menos eu. É preciso cuidado e carinho ao fechar a semana.

Desatenção implica sofrer mais do que o necessário, no nosso caso.

Eu não entendia pq os domingos eram insuportáveis até um amigo mais velho me contar sobre os domingos sangrentos do Rimbaud. Eu gosto de ter amigos mais velhos, de estar perto de pessoas que viveram o que eu nunca vivi e de saber sobre futilidades fundamentais: que para Rimbaud, assim como para nós, os domingos também eram sangrentos. Os amigos mais velhos ouvem nos gritos da Jane um série de harmônicos que ainda não vivi para poder escutar. Que nunca viveria. Os amigos mais velhos habitam sempre um circulo acima de nós. Gosto de sentir, no topo da cabeça os pés quase não do que um dia todos vamos ser. Os pés um pouco mais leves. Sem nenhuma geração que os proteja do inevitável: o próximo passo será o último antes do fim. Gerações futuras nos protegem cada vez menos. A rede ficará, a cada ano que passa – a partir de ontem, sempre um pouco mais frágil.

 Se agüentarmos firmes, todos um dia vamos ser o que os outros não são mais.

Os amigos mais velhos carregam uma verdade que não se pode fingir: avançaram um pouco mais sobre o inevitável. Os amigos mais velhos são o fracasso do sucesso. A vida um pouco mais perto do real. Os dias passando, cada dia, mais rápidos sem que nada possa ser feito. Kamikaze na direção precisa do chão. Os mais velhos possuem uma seriedade que não conseguimos entender. A cada domingo eu tenho um pouco menos de medo de envelhecer. São bons os anos ao seu lado. Conhecer pessoas mais velhas como se tivéssemos todos os tres a mesma idade. Talvez esse sejam, para sempre, os melhores anos da minha vida.

Mas sempre haverá uma montanha um pouco maior.

       Será?

Podemos subi-la de mãos dadas.

Será?

Podemos competir para ver quem de nós chega primeiro lá no alto.

Ou ver quem agüenta mais tempo antes de desistir.

Quem de nós dois tem menos medo do infinito?

 

 

A cada dia que passava íamos nos tornando um pouco menos futuros ex de nós mesmos. Ríamos das mesmas piadas. Escutávamos as mesmas musicas e assistíamos  com devoção religiosa a um único programa semanal na tv. Passava no começo das madrugadas de domingo. Sempre juntos. Sempre procurando rir de todas as tiradas inteligentes e engraçadas da apresentadora moderna. Por mais que, secretamente, tivéssemos certeza de que as nossas tiradas eram muito mais engraçadas e inteligentes. A única desvantagem era que ainda não estávamos sendo ouvidos por muitas pessoas. Mas tudo é uma questão de futuro e os velhos nos dão uma certeza bonita sobre o futuro então acreditávamos. Nos velhos e no nosso futuro. Era o nosso ritual de domingo, gastar as ultimas risadas com o humor alheio. Inertes. Descansando antes de ser. E era bom antes de ser. Por mais ansiosos que tivéssemos sido.

Manter segredos é o segredo do vencedor. Por isso não quero saber tudo sobre você. Por isso você nunca saberá tudo sobre mim. Geheimnis. Só eu conheço a curva de cada letra que escrevo. Ninguém mais. 

sexta-feira, 3 de julho de 2009

- lady sanchez, conhece esse lugar?















Ontem tu me disse que pela primeira vez entendia a letra da musica Pais e Filhos. Na hora eu não dei muita importância. Não posso dar importância a todas as coisas que as pessoas me falam, senão me perco de mim e acabo confuso e irritado. Mas hoje tu me escreveu de novo para dizer que está confusa. E hoje eu lembrei da musica pais e filhos e foi isso o que tentei te explicar naquele email.

Talvez uma outra visão sobre a mesma letra. Talvez a mesma visão, só que vista por mim. Estamos longe. Às vezes fica chato estar longe.

É bom ter amigos que falam a mesma língua. É confortável. A montanha é mais bonita quando ecoa e assim são as amizades. Não importa de onde tu grite, não importa a distancia, sempre escutaremos a própria voz gritando de volta. Ecoar não é falar sozinho. Ecoar não é falar consigo. Não tem nada a ver com o fascínio diante do espelho. Ecoar é entregar o seu todo para receber de volta apenas o quanto a geografia pode te devolver. Os ecos são pequeninos presentes do infinito. Dos ouvidos do outro lado do computador. O eco é o inesperado. Pode nunca voltar. O vento pode sempre mudar. Sempre muda. O quê acontece com os nossos gritos quando atingimos o topo da montanha?

Às vezes estamos muito mais sozinhos do que pensamos.

Se tu olhar em volta, sempre haverá uma montanha um pouco maior. Por mais distante que ela possa estar.

Por mais inteiro que esteja, sempre haverá uma parte tua longe de ti.

Pelo menos é assim que eu reconheço meus amigos. Uma parte minha longe de mim.

quinta-feira, 2 de julho de 2009

nem tanto.


Eu não quero aparecer. A janela está fechada pq eu não quero aparecer. Eu não fui no seu aniversario. Eu te deixei esperando no café. Eu não atendi quando o telefone tocou piscando o seu nome pela décima vez na mesma tarde. Eu não quero aparecer.

Existem épocas na vida em que a nossa existência consiste basicamente de fugazes acenos nas partes transparente do castelo.  Faz frio sempre que fico sozinho, mas não corro mais o risco de morrer congelado.

É preciso parar de correr o risco de ficar sozinho. Parar de sentir o medo da solidão. Esquecer os motivos, não pensar nas possibilidades, desfazer o premeditado. É preciso encarar os fatos: a porta que você espera não vai se abrir.

quarta-feira, 1 de julho de 2009


sobre levitar.

Tem feito bastante sol na grande cidade. Dias inteiros cor de laranja. Faz dois dias que não saio de casa para quase nada. Terminei a primeira parte de um livro novo e é bastante confortável essa sensação de dever cumprido.

Trata-se de um livro triangular movimento para vozes pequeninas. O que me deixa atento sempre para essa figura. Aprofundar-se em uma figura pode ser perigoso quando esquecemos que a vida não tem nenhuma figura definida em suas formas naturais. O natural não tem forma. Por mais parecidas que as formas sejam, vistas de perto, elas nunca serão iguais. A natureza não tem triângulos, nem quadrados, nem círculos perfeitos. A natureza é um passo depois desse. 

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